Capítulo 2
-Que dia péssimo.
Chovia, e aquele dia eu lembrará de levar guarda-chuva, embora adorasse sentir as formas como os pingos caiam na minha pele e molharam minha roupa. aquela garota parecia não gostar, então ofereci-lhe uma carona embaixo do meu guarda chuva.
Com a cara um tanto quanto amarrada aceitou.
-Está melhor agora? -Perguntei.
Olhou-me de cima abaixo e disse:
-Não faz mais que obrigação!
É claro que fiquei um tanto chateada, posso me definir com uma pessoa sensível, talvez eu seja um castelo de cartas, o vento sopra e derruba, mas sempre estarei reconstruindo. Me reconstruindo. E foi o que tentei, observando os pingos do guarda-chuva escorregando e caindo. Senti imensa vontade de senti-los. A chuva aumentava a cada tic-tac do relógio e o vento corria. Não resisti e deixei de me esconder do que tempo e os céus proporcionavam a mim. Entreguei o guarda-chuva a garota, e pus me fora. E encontrava-me ali. Meio a uma rua de quadriculados brancos, bancos e flores com gotas, borboletas costumavam voar por ali.
-O que está fazendo?
Meus neurônios agitam-se no hipotálamo e o início do filme “Minha vida sem mim” se passa. O som das gotas caindo, uma filmagem escura com um tom azulado.
“Esta é você.
De olhos fechados, na chuva.
Nunca pensou que fosse fazer algo assim.
Você nunca se viu como… não sei como descreveria, como uma dessas pessoas.. que gostam de olhar para a lua, ou que passam horas contemplando as ondas, o pôr-do-sol, ou…
Deve saber de que tipo de pessoas estou falando.
Talvez não saiba.
Seja como for, você gosta de ficar assim… lutando contra o frio, e… sentindo a água penetrando sua camisa, e tocando sua pele.
E da sensação do chão ficando fofo sob seus pés, e…
Do cheiro.
E do som da chuva batendo nas folhas.
De todas as coisas que estão nos livros que você não leu.
Essa é você.
Quem teria imaginado?
Você.”
Volto a mim, a ela, a resposta.
-Lutando contra o frio, e sentindo a água penetrando em minha camisa e tocando minha pele.
-Olha…
Me inspirei a criar meu próprio roteiro.
-Sentindo o cheiro da chuva. Dela misturada com a terra em algum lugar onde a natureza prevaleça, sentindo certo vapor exalando do chão e em como a sensação de gelo é boa. Estou ouvindo as nuvens chorarem, sem saber se é de tristeza ou alegria.
-Provavelmente seja de tristeza, agora tome! Não quero que se enxarque, posso ligar para algum táxi ou até um uber. -Ela disse me entregando o guarda-chuva.
-Não -toquei em sua mão e devolvi a ela. Ela não aceitou. Deixou que ele caísse. E me fitava, não com rancor mas com certa curiosidade.
Olhei ao chão, ela também.
- Me desculpe por ter derrubado -ela disse se abaixando para pegar o objeto.
- Não! -exclamei- pelos teus olhos parece que quer inundar-se. -fiz uma pausa- inunde-se comigo.
E assim fizemos, Lis que logo depois descobri ser o nome dela ficou um bom tempo com o rosto ao céu recebendo seu presente. Eu havia sentado. Ora ou outra alguma pessoa passava e nos olhava. Dava para se ouvir um som de violão ao fundo.
Com passos leves começamos a se entender em pequenos movimentos que tão logo viraram uma dança. Admirei como ela era boa com aquilo.
Depois de alguns passos o Sol ousava nascer outra vez. Sentamos no banco, mesmo que úmido e tentamos assistir ao show.
Elogiei os passos e ela me contou que fazia dança contemporânea. Aproveitou também o diálogo para se desculpar por ter me dito aquilo quando eu havia lhe oferecido o guarda-chuva. Disse que era a fome.
-Hoje é seu dia de sorte! Não moro muito longe daqui, pode ir comigo a minha casa, faço um café e te empresto roupas secas.
Não foi de início que ela topou, senti um receio e hesitação. Contudo entendia.
- Não te farei nada
-Que isso! Obrigada pela preocupação, mas não precisa, não quero atrapalha.
-Não! Sem problema algum! Fique livre para decidir -disse Mari.
-Parece que hoje é o seu dia de sorte também pois terá uma companhia para ir para casa. - E sorriu meigamente à Mari, que lhe respondeu com palminhas.
E elas caminharam pelas ladrilhas do centro da cidade, ora perguntavam sobre gostos, ora cantavam músicas que descobriam apreciar similiarmente, andavam como se fosses almas unidas por vidas passadas, só esperando para se rever e se renovar. Como se fossem duas pessoas que estivessem predestinadas a se conhecer.